quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Deputados pressionam para votar projeto que incrimina ministros do STF

Texto prevê crime de responsabilidade a membros da Corte por usurpar competência dos Poderes

Parlamentares vão pressionar o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, Osmar Serraglio (PMDB-PR), para incluir na pauta da próxima semana um projeto de lei que prevê o crime de responsabilidade para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) por usurpação de competência do Poder Legislativo ou do Executivo. Serraglio, no entanto, já afirmou que não é hora de pautar matérias que causam "celeuma".
O projeto – apresentado em março deste ano - já tem parecer pronto do relator Marcos Rogério (DEM-RO) pela admissibilidade da proposta, falta apenas pautar para votação na CCJ. Um dos autores do projeto é o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), que considera oportuna a apreciação da admissibilidade do projeto antes do recesso de fim de ano. “Vai depender muito do que acontecer hoje”, disse Sóstenes, se referindo ao julgamento do afastamento do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) do comando do Senado.
Sóstenes citou como exemplos de “ativismo” exacerbado algumas decisões da Corte, como a que proibiu a vaquejada por entender que a prática causa sofrimento ao animal, a legalização da união estável entre casais do mesmo sexo e, finalmente, a decisão da 1.ª Turma do STF de que não é crime o aborto realizado durante o primeiro trimestre de gestação. “Em vários momentos estão usurpando as prerrogativas”, concluiu o deputado, que é membro da bancada evangélica.
Sóstenes calcula que tem apoio suficiente para incluir o tema na pauta e votos para aprovar a proposta na CCJ, mas para levar à votação, terá de vencer a resistência de Serraglio. Ativistas de grupos que se intitulam “pró-vida” fizeram pressão na sessão de terça, 6, para incluir o tema na pauta de discussões da comissão.
Ao Broadcast Político, Serraglio disse que tem outras prioridades para votar na comissão, entre elas a proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência. O presidente da CCJ afirmou que não quer dispor de tempo com outras matérias que causam “celeuma” e anunciou que não pretende pautar o projeto de Sóstenes. “Não é a hora de pautar. Dá a impressão que é coisa despropositada. Tem de ser votado na hora em que as coisas estiverem serenadas”, justificou Serraglio.

A PANE SECA DOS MELIANTES POLÍTICOS

por Ruth de Aquino. 


Se o combustível de um presidente do Senado for a credibilidade. Se a autonomia de um presidente do Senado depender de sua lisura. Se um presidente do Senado, na linha sucessória da Presidência da República, se tornar réu do Supremo Tribunal Federal por peculato (traduzindo: desvio de verba pública para uso pessoal)... A emergência estará configurada.
Renan Calheiros, avise à torre que o senhor não tem mais condições de pilotar nada, muito menos votação contrabandeada no meio da noite sujeita a trovoadas. Não finja ser pane elétrica, não culpe o Judiciário, diga logo que é pane seca e que lhe falta o combustível da credibilidade. Ninguém acredita quando o senhor elogia a Lava Jato e condena a corrupção.
Admita que calculou mal os riscos e que, de tanto desafiar as regras e a sensatez, de tanto se sentir protegido pela máquina do PMDB, acima das nuvens, de tanto agir no limite da paciência da sociedade, acabou vitimado pelo sentimento de onipotência, talvez herdado de seu padrinho José Sarney.
Faça como fez há nove anos, quando renunciou à presidência da mesma Casa para não ser cassado, ao ser acusado de pagar a pensão de sua filha extraconjugal com dinheiro de empreiteira. Voltou depois, com a bênção de todos, Sarney e Lula e seus companheiros. Sempre com aquele risinho. Renan responde a mais 11 processos no STF, oito deles da Lava Jato. Ou Renan é culpado ou é o político mais perseguido da história do Brasil.
O rabo preso gigantesco de Brasília explica a cumplicidade, no Senado, de figuras como Fernando Collor e Lindbergh Farias. Eles estavam entre os 14 senadores que apoiaram Renan na pressa de votar o projeto da Câmara, que desfigurou as dez medidas anticorrupção de iniciativa popular. Renan nem queria votação nominal, só voto simbólico. Sua manobra foi desmascarada a tempo. A maioria no Senado percebeu que o plano de voo de Renan era irresponsável. Renan descobriu que não tinha autonomia.
Na Câmara, o rabo preso aliou Pedro Paulo a Jandira Feghali e Indio da Costa contra o pacote original anticorrupção. O PT de Lula e Dilma e o PRB de Crivella também se aliaram contra o pacote anticorrupção e a favor de enquadrar o Judiciário. Jair Bolsonaro e Jean Wyllys – que sempre viveram aos cuspes e berros – se uniram a favor das medidas anticorrupção mas foram derrotados.
Há um claro conluio político, liderado por investigados na Lava Jato, para melar investigações de propina, caixa dois e corrupção. Sob o pretexto de coibir abusos de autoridade – que devem mesmo ser refreados para evitar o “espetáculo” e o desrespeito a direitos dos delatados –, o Congresso ameaça uma operação que mudou o Brasil para sempre.
Antes do juiz Sergio Moro e a equipe de Curitiba, sabíamos dos desvios de dinheiro público, mas não se imaginava o grau, ou o valor. Não se imaginava a amplitude das quadrilhas no Poder. Os métodos, os laranjas, os superfaturamentos, as joias da Coroa e a total impunidade de quem dilapidava obras de infraestrutura e serviços essenciais. Além dos roubos, terão de ser atacados com urgência os privilégios, as mordomias, os supersalários na casta política. Mas já é um começo de moralização do serviço público.
Renan, em evento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), afirmou que o sistema político brasileiro está “falido e fedido”. Não percebe que estão colando nele a pecha de cinismo? Sua eloquência contra o presidencialismo não comoveu. O presidente da OAB, Claudio Lamachia, defendeu o afastamento imediato de Renan. Não como admissão de culpa, mas para não comprometer os trabalhos do Senado, enquanto for réu no STF.
Por que esse açodamento do Congresso, em dezembro, perto do Natal e de mais um recesso de verão? Dá para entender o “timing”. Vem aí a mãe de todas as delações. A maior empreiteira do país, a Odebrecht, envolvendo 75 executivos e ex-dirigentes, deve citar 200 políticos. Pai e filho, Emilio e Marcelo Odebrecht assinaram a delação premiada, prometeram pagar multa de R$ 6,8 bilhões e pediram desculpas por “práticas impróprias”. É com esperança, não com ceticismo, que leio o comunicado histórico da Odebrecht.

“Não importa se cedemos a pressões externas. (...) Fomos coniventes com tais práticas. (...) Foi um grande erro, uma violação dos nossos próprios princípios, uma agressão a valores consagrados de honestidade e ética.” E por aí vai. Leiam. As dez medidas de compromisso com o futuro da Odebrecht são exemplares. No topo da lista: “Combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas, inclusive extorsão e suborno”.
Quando leremos desculpas e compromissos de nossos políticos? Se o Brasil está em pane seca, com milhões de pessoas devolvidas à pobreza, é por ganância e incompetência de seus governantes.