quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Calero diz à Polícia Federal que Temer o pressionou no caso Geddel



Calero diz à Polícia Federal que Temer o pressionou no caso Geddel

Ex-ministro da Cultura diz que foi convocado por Temer, e que o presidente defendeu a atitude de Geddel para liberar obra polêmica em Salvador.



O ex-ministro da Cultura Marcelo Calero disse, em depoimento à Polícia Federal, que sofreu pressão do presidente da República, Michel Temer, para encontrar uma solução para o projeto imobiliário de Salvador em que o ministro Geddel Vieira Lima tem um apartamento. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional embargou a obra.
O ex-ministro da Cultura Marcelo Calero prestou depoimento à Polícia Federal no último dia 19. Ele trouxe novos detalhes da pressão que diz ter sofrido no governo para liberar a construção de um prédio em Salvador onde o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, tem um imóvel.
Calero afirmou no depoimento que no dia 6 de novembro recebeu a mais contundente das ligações realizadas por Geddel, e que Geddel disse, “sempre de maneira muito arrogante, que se fosse preciso pediria a cabeça da presidente do Iphan e que falaria até com o presidente da República”. O Iphan é o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que embargou a obra.
Marcelo Calero afirmou que em outro dia recebeu uma ligação do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, que argumentou que, se a questão estava judicializada, não deveria haver decisão administrativa definitiva a respeito. E que Calero tentasse construir essa saída com a Advocacia Geral da União.
O ex-ministro da Cultura também afirmou no depoimento que no dia 16 de novembro compareceu a um jantar oferecido pelo presidente aos senadores no Palácio da Alvorada, e que após contar-lhe toda a história, o presidente disse a Calero “para que ficasse tranquilo, pois, caso Geddel lhe procurasse, ele diria que não havia sido possível atender a seu interesse, por razões técnicas”.
No dia seguinte, o ministro Eliseu Padilha telefonou perguntando sobre como Geddel poderia recorrer da decisão do Iphan. Em resposta, Calero conta que explicou como funcionam genericamente os recursos de atos administrativos.
No mesmo dia, Calero afirmou que foi convocado pelo presidente Michel Temer a comparecer no Palácio do Planalto, e que nesta reunião o presidente disse a ele que a decisão do Iphan havia criado dificuldades operacionais em seu gabinete, já que o ministro Geddel encontrava-se bastante irritado, e que o presidente disse para que Calero construísse uma saída para que o processo fosse encaminhado à AGU, porque a ministra Grace Mendonça teria uma solução. Calero afirmou que, no final da conversa, “o presidente disse que a política tinha dessas coisas, esse tipo de pressão”.
O ex-ministro da Cultura afirmou que, ao final da conversa, com o presidente, ficou bastante desapontado, uma vez que foi advertido em razão de ter agido sem cometer qualquer tipo de irregularidade; e que, por fim, disse ao presidente que não se sentia à vontade para tomar qualquer decisão naquele processo, e assim despediu-se de Temer.
Marcelo Calero disse ainda no depoimento que no dia seguinte recebeu uma nova ligação do secretário de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha, e que Gustavo comunicou a ele que havia ingressado com recurso da decisão administrativa junto ao Ministério da Cultura e ao Iphan, e que Calero deveria encaminhar os autos do processo para a AGU.
Calero disse que respondeu que já havia tratado a respeito deste assunto com o presidente, que não tomaria qualquer decisão neste processo.
Segundo o ex-ministro da Cultura, Gustavo Rocha disse que também havia conversado com o presidente e que seu intuito era o de que Calero encaminhasse os autos para a Advocacia Geral da União.

O ex-ministro da Cultura disse que este último episódio foi determinante para a saída dele do governo, pois demonstrava a insistência do presidente em fazer com que ele interferisse indevidamente no andamento do processo.
Foi no dia 18 de novembro, depois de receber o telefonema do secretário da Casa Civil, Gustavo Rocha, que Marcelo Calero pediu demissão do cargo de ministro da Cultura.
         
Depois do depoimento, a Polícia Federal pediu autorização ao Supremo Tribunal Federal para abrir inquérito sobre o caso, e aguarda a decisão da Corte.
O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, admitiu que conversou com o ex-ministro Calero sobre o prédio em Salvador, mas, segundo ele, para que fosse encontrada uma solução na forma da lei.
Padilha disse que, diante da controvérsia entre órgãos públicos federais, sugeriu que Calero buscasse a Advocacia Geral da União, já que a Constituição prevê que cabe à AGU identificar e propor soluções para questões jurídicas relevantes nos órgãos federais. Ainda segundo Padilha, Calero ignorou a sugestão.
Gustavo Rocha disse que sua conversa com Calero foi no mesmo sentido, de encaminhar a questão para a AGU, em decorrência da competência constitucional do órgão.
Porta-voz diz que o objetivo do presidente era arbitrar conflitos entre os ministros
O Palácio do Planalto também reconheceu as conversas do presidente Michel Temer com Marcelo Calero sobre o prédio em Salvador. Segundo o porta-voz, o objetivo do presidente era arbitrar conflitos entre os ministros.
“O presidente Michel Temer conversou duas vezes com o então titular da Cultura para solucionar impasse na sua equipe e evitar conflitos entre seus ministros de Estado. O presidente da República trata todos os seus ministros como iguais e jamais induziu algum deles a tomar decisão que ferisse novas internas ou suas convicções. É a mais pura verdade que o presidente Michel Temer tentou demover o ex-ministro de seu pedido de demissão e elogiou o seu trabalho à frente da pasta. O ex-ministro sempre teve comportamento irreparável enquanto esteve no cargo. Portanto, estranha sua afirmação, agora, de que o presidente o teria enquadrado ou pedido solução que não fosse técnica”, afirmou Alexandre Parola.
Segundo o porta-voz, o presidente Michel Temer se disse surpreso com boatos de que o ex-ministro Calero teria solicitado uma segunda audiência antes de se demitir, somente com o intuito de gravar clandestinamente conversa com o presidente da República para posterior divulgação.