sábado, 18 de fevereiro de 2017

O DESPRESTÍGIO DA SUPREMA CORTE BRASILEIRA DIANTE DE UMA SOCIEDADE EXAUSTA

Em 2009, a revista inglesa The Economist, mais importante publicação de economia do mundo, fez uma análise do STF no Brasil: “Alojado em um palácio modernista em Brasília, o Supremo Tribunal Federal brasileiro é, há tempos, uma espécie de piada”.
Para chegar a tal conclusão, seus especialistas levantaram fatos como:
1) é a corte mais sobrecarregada do mundo, graças a uma infinidade de direitos e privilégios impregnados na Constituição de 1988 do país;
2) o direito quase ilimitado de apelar das decisões de qualquer magistrado até que o caso alcance os 11 sábios e sábias da Suprema Corte;
3) o tribunal vive à beira de uma revolta. A corte suprema recebeu 100.781 casos no ano passado.
4) a  Justiça é excruciantemente lenta.
5) como resultado, litígios protelatórios são usados como um truque para evitar sanções (O Brasil tem mais litígios por pessoa que qualquer outro país latino-americano excetuando a Costa Rica).
Mas, naquele ano, nada disso poderia ser comparado ao que ainda estava por vir.
Em 2014, o STF decidiu, por seis votos a cinco, absolver do crime de formação de quadrilha o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-presidente do PT José Genoino e outros cinco condenados no processo do “Mensalão do PT”, entre eles ex-dirigentes do Banco Rural e o grupo de Marcos Valério. A decisão foi tomada no julgamento dos recursos chamados “embargos infringentes”, apresentados pelos oito condenados.
O “Mensalão” foi o nome do principal escândalo que atingiu o governo do ex-presidente Lula em 2005 – durante o primeiro mandato – e que consistiu em um esquema de pagamento de propina de R$ 56 milhões a parlamentares para que votassem a favor de projetos do governo.
Os seis ministros que votaram pela absolvição (Rosa Weber, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Teori Zavascki) entenderam que não ficou configurada a quadrilha. Segundo a interpretação desses ministros, apesar de os oito terem cometido crimes conjuntamente, não formaram uma associação criminosa com o objetivo específico de cometer crimes.
Em 2016, o ministro Luís Roberto Barroso do STF concedeu indulto ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu para extinguir toda pena imposta a ele no processo do Mensalão.
O caso acima foi histórico e ficou seriamente marcado para opinião pública como uma das maiores afrontas aos cidadãos brasileiros.
Hoje, a população tem uma percepção muito parecida com a do The Economist sobre a Suprema Corte e continua se sentindo completamente desonrada.
A primeira fase da Operação Lava Jato, que investiga o escândalo do Petrolão, foi deflagrada em março de 2014. Após três anos, as denúncias se acumulam, e nenhum político com foro privilegiado foi condenado no STF. Apenas quatro viraram réus.
Em contraste, o juiz Sergio Moro já condenou 87 pessoas, algumas mais de uma vez, por diferentes crimes, totalizando 125 sentenças. Entre eles estão políticos sem mandato e que, portanto, perderam o foro, como o ex-ministro José Dirceu (PT) e o senador Gim Argello (ex-PTB).
A explicação mais recorrente é a de que o STF, sendo a Corte mais importante do país, tem como função principal garantir a aplicação da Constituição Federal. E simultaneamente aos casos da Lava Jato envolvendo políticos com foro, o Supremo julga, todas as semanas, dezenas de outras ações, muitas delas urgentes.
E é precisamente por isso que há um grande debate para que haja mudanças no regime de foro privilegiado e desafogue o Supremo. Embora, o foro seja importante para evitar perseguições políticas contra autoridades, como pressões de investigados poderosos sobre juízes de primeiro grau, há obviamente pessoas demais com foro no Brasil: 22 mil.
Outro ponto foi levantado semana passada, quando o ministro do STF, Gilmar Mendes, criticou Moro e disse que a Corte tem que se manifestar. “Temos um encontro marcado com as alongadas prisões que se determinam em Curitiba. Temos que nos posicionar sobre esse tema, que conflita com a jurisprudência que construímos ao longo desses anos”, afirmou.
Ao longo de 37 fases da Lava Jato, Moro decretou 79 prisões preventivas. Atualmente, 22 ainda estão presos nessa modalidade, entre eles Cunha, o ex-ministro Antônio Palocci e o ex-governador do Rio Sergio Cabral.
E, por último, nesta quinta-feira (16), os ministros do STF decidiram que presos encarcerados em cadeias superlotadas ou com más condições de saúde e higiene podem ser indenizados por danos morais pelo governo. O entendimento foi que essa reparação seja financeira.
Diante de tudo isso, uma coisa está evidente: cansamos.
Nosso povo está exausto e profundamente decepcionado em perceber que aqueles que deveriam servir como guardiões da Constituição a dilaceram. E parecem estar cada vez mais insensíveis à voz da opinião pública.
A constatação feita por uma revista estrangeira em 2009 está mais do que consolidada para os brasileiros em 2017: o STF tornou-se uma piada. De mau gosto.
Por Elisa Robson - jornalista.

fonte:República de Curitiba