quarta-feira, 6 de setembro de 2017

BRASIL LEVA MEDALHA DE OURO EM PROPINOCRACIA

Mais de 4 milhões de ingressos foram vendidos, foi o maior número de países participantes, uma organização absolutamente impecável e o altíssimo nível técnico resultou em 15 recordes mundiais. Assim foram os Jogos Olímpicos de 1936. Com esses dados, a escolha do COI (Comitê Olímpico Internacional) poderia ser motivo de orgulho para a instituição, não fosse um detalhe: a cidade que recebeu as competições foi a nazista Berlim, de Adolf Hitler.
O COI acabou permitindo que o acontecimento esportivo mais importante da humanidade se tornasse vitrine para o mais hediondo propósito político que já existiu. O governo nazista, sob a batuta do ministro da propaganda do 3º Reich, Joseph Goebbels, investiu US$ 30 milhões no evento que serviu para exaltar, fortalecer e disseminar a imagem de superioridade ariana.
Tudo isso seria apenas vergonha e humilhação aos olhos das próximas gerações se um homem não tivesse participado das competições e mudado a história, deixando uma das mais valiosas lições para o mundo.
Enquanto o Führer percebia o imenso potencial dos Jogos Olímpicos para ser usado como arma de propaganda nazista, um negro americano do Alabama, sétimo filho de uma família de colhedores de algodão e neto de escravos, Jesse Owens (1913-1980) bateu quatro recordes olímpicos. Ele impôs a Hitler muito mais do que um desgosto. Ele provou ao mundo que a ideia de supremacia ariana não passava de uma farsa.
Em 1980, quando Owens morreu, de câncer, o então presidente Jimmy Carter, sulista, divulgou mensagem oficial de condolências à família e ao povo americano: “Talvez nenhum outro atleta em todo o mundo, em todos os tempos, tenha simbolizado melhor a luta humana contra a tirania, a miséria e o racismo”.
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Em 2009, o COI escolheu o Rio de Janeiro para sediar a Olimpíada de 2016. A capital fluminense venceu a concorrência com a espanhola Madri. Foi a primeira vez que a América do Sul recebeu o evento.
A candidatura brasileira foi muito festejada tanto pelos responsáveis quanto pelos torcedores, principalmente na praia de Copacabana, onde foi concentrada a espera pelo resultado.
Para sediar os Jogos Olímpicos, o Rio de Janeiro defendeu a tese de que deveria ser escolhida pelo ineditismo do local e pelo positivo momento econômico. “Os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro serão inesquecíveis, pois estarão cheios da magia e da paixão do povo brasileiro”, discursou o então presidente Lula da Silva, na época.
Assim como aconteceu em Berlim em 1931, antes do nazismo chegar oficialmente ao poder, parecia que a escolha do COI  pelo Brasil era muito boa e justa.
Contudo, descobrimos hoje que tal decisão fez parte de uma teia de corrupção e mentiras.
Segundo as investigações da Lava Jato, Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e do Comitê Rio 2016, orquestrou a compra de jurados da eleição da cidade sede da Olimpíada. Ele teria sido o responsável por interligar corruptos e corruptores. Em março deste ano, o jornal francês “Le Monde” também havia denunciado que, três dias antes da escolha, houve pagamento de propina a dirigentes do COI.
O Brasil, assim como a Alemanha, venceu a Espanha (Barcelona saiu derrotada para Berlim), após decisão do COI.
O Brasil, assim como a Alemanha, usou o evento esportivo mais importante da humanidade como pano de fundo para uma trama política abominável e corrupta.
O Brasil, assim como a Alemanha, está passando vergonha internacional por sua conduta.
Porém, diferente da Alemanha, estamos combatendo o problema internamente. A força-tarefa da Lava Jato é brasileira, formada por brasileiros dignos e corajosos. Tão dignos e corajosos que o juiz Marcelo Bretas, à frente do caso, declarou, com a lucidez de Jimmy Carter:
“A imagem do Brasil como um país em que conquistas negociais, artísticas e atléticas só são alcançadas por atos de corrupção é, além de falsa, um dano de grande monta a merecer rigorosa atuação do Poder Judiciário Nacional”.
Ao longo de sua carreira, Jesse Owens bateu oito recordes mundiais em diversas modalidades. Tenho certeza de que, como o atleta americano, vamos vencer todas as barreiras. Vamos provar para o mundo que o nosso inimigo, a corrupção sistêmica, é poderoso, mas não mais do que a determinação daqueles que são honestos e justos.

por Elisa Robson,  jornalista e administradora da página República de Curitiba BR.