sábado, 17 de novembro de 2018

ONDE ESTÁ O DINHEIRO?

“Onde está o dinheiro?” diz o começo da famosa música de carnaval, cantada por Gal Costa. O caminho que a letra segue é diferente do que será abordado aqui, mas tomo emprestada a pergunta inicial para nossa reflexão.
Na calada da noite, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE) colocou em votação o projeto que propunha o escandaloso aumento de 16% aos Ministros do STF. Alguns afirmam que Eunício o fez por vingança, por não ter sido reeleito, mas ele nega. O efeito cascata dessa medida será desastroso.
O “curioso” é que esse mesmo Senado que concedeu o aumento aprovou o corte em Fundo para a Educação… Você acha que isso é “justo”?
Um resumo do que estamos testemunhando é o réu votando o aumento do salário do juiz e mandando a conta para a vítima pagar! [1] Barcelona é aqui.
Qualquer funcionário, quando vai solicitar um aumento ao chefe, procura mostrar seus resultados positivos para justificar o pedido. O STF, só para citar um caso, não julga o caso de Renan Calheiros que foi denunciado em 2007 (já o de Bolsonaro…). Nem a PGR nem o STF conseguiram mandá-lo para a cadeia porque nem julgado ele foi. E há outros casos de figurões que tiveram seus crimes prescritos. Será que se demonstrássemos essa eficiência para nosso chefe ele nos daria um aumento?
A missão de um Ministro do STF deveria ser zelar pelo cumprimento da Constituição Federal, mas infelizmente, diversas vezes, testemunhamos exatamente o contrário. E este é só mais um exemplo.
Os absurdos que circundam esse aumento são diversos:
  • Não há previsão na LDO (nem no Orçamento);
  • O Governo não ofereceu previsão do impacto do aumento nos próximos anos;
  • A proibição de aumentos nos últimos 180 dias de Governo não foi revogada;
  • Etc.
Afinal, o Brasil é um país ou um galinheiro? Que leis ainda devemos respeitar? A sensação que temos é que nós, todas. Eles, as que forem convenientes.
E os “Ghostbusters” de plantão, desconsiderando que o Presidente eleito, Jair Bolsonaro, assumirá apenas em 1º de janeiro e o novo Congresso em 1º de fevereiro do ano seguinte, atribuem a eles essa “derrota” [2]. Porém ela não é do Governo, mas de todo o povo brasileiro, pois os desempregados racharão essa conta juntamente conosco. [3]
Os abutres, sem conexão com a realidade, esquecem que a maioria daqueles que aprovaram esse escandaloso aumento não foram reeleitos. E pior: ainda tentarão aprovar projetos que esvaziam a Lava Jato! Mas esse assunto demanda outro artigo…
Não é preciso forçar muito a memória para lembrar que há pouquíssimo tempo tivemos que aceitar o argumento da falta de verba para o voto impresso. As inúmeras denúncias, os estudos científicos, as invasões por hackers, etc. não foram suficientes para convencer nossos magistrados da urgência do respeito à Legislação Eleitoral (sim, esse sistema de urnas é ilegal, como já abordei em artigos anteriores).
Segundo estimativa feita pelo próprio TSE (sem apresentar nenhum estudo completo que se pudesse conferir de forma independente) o custo para a implantação do voto impresso seria de R$ 1,8 bilhão. Já pela estimativa de estudo de Amilcar Brunazo Filho, o custo final, já com margem de segurança, seria de R$ 320 milhões (menos de 20% do valor estimado pelo TSE). [4]
O aumento de 16% dos Ministros do STF, com efeito cascata a todos os juízes do país (federais e estaduais), procuradoria geral, promotores, parlamentares (sim, eles também!) irá onerar o país em cerca de R$ 6 bilhões (no mínimo).
Este aumento não tem fundamento moral, monetário ou politico. Os juízes alegam que ele repõe a inflação, afinal para a realidade brasileira um aumento de R$ 6.000,00 num baixíssimo salário de R$ 33.000,00 é muito natural…
Como se já não bastasse o descalabro, esse reajuste elevará o teto do funcionalismo. No mundo paralelo em que nossos burocratas vivem os unicórnios azuis festejam cantando com sambistas famosas e ainda se vitimizam dizendo fazer parte de minorias perseguidas…
Note também que há funcionários públicos que, graças aos benefícios pessoais adquiridos, ganham acima do teto, que tem um pé “direito” altíssimo!
Então eu pergunto: se não há verba para o voto impresso, de onde virá o dinheiro para esse abuso de poder?
A votação desse aumento ao Judiciário está no Congresso Nacional desde 2016, onde ficou engavetado devido às dificuldades políticas para sua aprovação. Foi então que o Ministro Luiz Fux concedeu o auxílio moradia a todos os juízes do país no valor aproximado de R$ 4.200,00 que nada mais é do que um aumento indireto e sem restrições (para quem tem casa ou não, na comarca em que trabalham). Então foi apresentada a seguinte situação: se derem o aumento, retiram o auxílio moradia (vide pronunciamento de Toffoli após o reajuste). Como você chamaria isso?
E ainda há um detalhe que poucos estão percebendo: não será fácil extinguir o auxílio moradia, pois ele já está incorporado ao salário!
Qualquer profissional, quando recebe um convite para trabalhar em uma cidade que não é a sua, avalia as condições. Coloca no orçamento os gastos com moradia, transporte, vestuário, etc. A aceitação da proposta depende da relação custo/benefício. Por que funcionários públicos que não tem sequer o risco alto de serem demitidos devem ter todas essas mordomias pagas por nós e não devem agir como o profissional privado?
A farra com o dinheiro público parece não ter limites.
Uma semana antes do presente dado pelo Congresso Nacional, ministros do STF e do STJ ganharam uma viagem de quatro dias em Nova York, para participar de um seminário da FGV [5]. E não podia faltar a cereja do bolo: um jantar com o Arnoldo… [6]
Até quando só nos restarão a indignação e a conta?
Voltemos um pouco no tempo: a alegação feita pelo TSE para o veto parcial à Lei nº 13.165/2015 (Voto Impresso) era seu alto custo.
Pois bem, tomemos como base o próprio valor “encontrado” pelo TSE (R$ 1,8 bi), sabe-se lá como, pois não apresentaram nenhuma planilha (se o Estado é laico, por que temos sempre que depositar fé em tudo que o TSE diz?).
Com uma simples calculadora notamos que ele corresponde a 30% dos gastos estimados com esse aumento oferecido à Justiça! Salta-nos os olhos a incoerência deste “reajuste”. E nem estou tocando no assunto do Fundo Partidário bilionário e de seu complemento posterior…
Nosso país tem um déficit contínuo, de vários anos, nas contas públicas. Isso acontece porque o Governo gasta mais do que arrecada. O segundo maior gasto do Governo Federal é com Pessoal (o primeiro é com a Previdência, que inclui a Justiça…). Cerca de 80% do gasto do Poder Judiciário é com pessoal (o Legislativo gasta mais de 80% nesse item, mas provavelmente também irá pegar uma carona nesse aumento).
Se em sua casa você gasta mais do que ganha, pediria para sua família economizar ou compraria algo supérfluo?
Para fechar essa conta o Governo terá que tirar de outra parte do orçamento. Quem você acha que sairá perdendo com isso?
Sobrará menos dinheiro para o funcionamento da máquina estatal e para investimentos. Mas isso não deve ser importante para os membros do mundo dos 3%… [7]
Continuando nesse ritmo, o Judiciário terá os melhores salários, mas não terá dinheiro para funcionar no país da jabuticaba.
E você sabe por que eles fazem isso? Porque eles podem. Porque é legal (ou quase isso). Porque lhes atribuímos esse poder excessivo.
Nestas eleições você escolheu seus candidatos fundamentando-se em alguma proposta de diminuição do tamanho e do poder que atribuímos ao Estado? Enquanto essa não for nossa premissa de escolha, continuaremos sendo eternos reféns…
E a solução para esse tipo de impasse não é difícil, bastaria vontade política.
Há muitos anos eu me faço as seguintes perguntas: Por que os salários dos funcionários públicos não são vinculado à arrecadação do Município, Estado ou País? Por que não defini-los como uma porcentagem da arrecadação?
Se o fossem desta forma, não seriam mais necessárias as desgastantes discussões, troca de favores, etc. para os reajustes que vemos recorrentemente.
Porcentagens de cargos extintos poderiam ser incorporados a outros e novos cargos só poderiam ser criados com a redefinição das porcentagens dos cargos existentes.
Esta e outras sugestões estarão presentes no volume 1 de uma série de livros que estou escrevendo há alguns anos, a ser lançada na Amazon, com propostas de sistemas inovadores na área de Política, Educação e Esportes.
Enfim, se o Presidente Temer não vetar esse aumento escandaloso (com o apoio de 89,4% dos brasileiros, segundo o instituto Paraná) [8], talvez Bolsonaro tenha que tomar uma atitude drástica: convidar Gal Costa para um Ministério.

artigo de Francisco Teodorico, em Conexão Política.