terça-feira, 25 de julho de 2017

Ministro dos Transportes usa assessoria do ministério para cuidar de redes pessoais

Maurício Quintella, ministro dos transportes, utiliza funcionários contratados para cuidar da comunicação institucional do ministério para operar suas redes sociais pessoais. O contrato anual, de mais de R$ 6,5 milhões e renovado três vezes seguidas, não prevê qualquer gerenciamento de páginas pessoais do ministro.
O ministro acertou pessoalmente a participação da empresa contratada com verba pública para controlar e produzir conteúdo para suas redes. Em 25 de maio, o ministro, que é deputado licenciado pelo PR de Alagoas, teve reunião no ministério para tratar do assunto. A reunião durou cerca de uma hora e meia e contou com a participação de funcionários da empresa FSB Comunicação. No encontro, ficou acordado como seria feito o serviço.

Quintella passou suas senhas, que fazem alusão a ele e à pasta, aos terceirizados vinculados à empresa. Foi criado um perfil falso, de nome Maria Silva, para administrar o Facebook do ministro. Dessa forma, identidades de funcionários não ficariam expostas. Maria, identificada por um desenho infantil, bloqueou informações e tem como amigo um coordenador da FSB.

A FSB Comunicação controla desde 2014 as redes institucionais da Secretaria de Aviação Civil (SAC), absorvida pelo Ministério dos Transportes no ano passado. O contrato teve três aditivos. O último, em 26 de março deste ano, estipulava um preço de mais de R$ 6,5 milhões e vale até 2018. O documento oficial não prevê administração, gestão ou produção de conteúdo para páginas pessoais do ministro.

No dia 24 de junho deste ano, um assessor da empresa de comunicação designado para atender o ministério viajou para Jericoacoara (CE) com Quintella, para a inauguração do aeroporto da cidade. A orientação dada no ministério era que esse funcionário se concentrasse nas redes de Quintella. Em vídeo no Facebook pessoal do ministro, Quintella elogiou o “paraíso” de Jericoacoara e prometeu entregar 50 aeroportos regionais até o fim do ano que vem, além de declarar uma meta de que todo brasileiro distante pelo menos 150 quilômetros de um aeroporto consiga viajar a cidades maiores e até para o exterior.

Procurada, a assessoria do Ministério dos Transportes, que é coordenada pela FSB Comunicação, negou que as redes do ministro sejam controladas por outra pessoa além do próprio ministro. “As redes sociais pessoais do ministro são de sua responsabilidade, não implicando em qualquer ônus para o ministério”, disse a pasta em nota. Em outra resposta, o ministério afirmou: “O ministro dos Transportes, Portos e Aviação Civil, Maurício Quintella Lessa, é quem administra suas redes sociais — Facebook, Instagram, Twitter e Snapchat — desde quando ainda era deputado federal”. Apesar da negativa, há registros das tratativas de Quintella para que a empresa assumisse o controle de suas redes sociais.

Antes de pedir os serviços pessoais à equipe da FSB contratada apenas para trabalhos institucionais, o ministro tinha redes com aspecto bastante pessoal e amador. A empresa chegou a produzir um estudo analisando o perfil das redes pessoais do ministro e apresentou sugestões para evitar impropriedades e dar tratamento homogêneo às várias plataformas. O estudo encontrou casos de erro ortográfico, duras respostas a críticas de internautas e fotos com familiares, além de uma fotografia em destaque que ainda o trazia como deputado.

“Mauricinho filho, só no governo do Temeroso tu seria Ministro”, provocou o internauta João Firmino Marinho nos comentários em 17 de março. No mesmo dia, o ministro rebateu: “Não, Joãozinho! Fui convidado pelos 'seus' para ser ministro, mas óbvio que não aceitei”. Nessa época, o conteúdo ainda não estava sob a responsabilidade da empresa contratada pelo ministério.

O GLOBO consultou outros ministérios chefiados por políticos e a resposta foi que a praxe é que o partido pague pela gestão das redes sociais pessoais dos ministros. É o caso de Gilberto Kassab (PSD-SP) no Ministério de Ciência e Tecnologia, e de Mendonça Filho (DEM-PE) na Educação. A assessoria de Kassab explicou que, como a rede é de caráter pessoal, o setor público não pode geri-la ou bancá-la, e que isso violaria o princípio constitucional da impessoalidade na gestão pública, já que a máquina estatal não pode ser usada em vantagem particular, como para fins eleitorais. Ou seja: sites do governo não podem promover a imagem do político no poder, e deve haver separação entre o público e o privado. A equipe de Mendonça Filho afirmou que a empresa empregada pelo ministério “nunca produziu nada para as redes do ministro”, que são custeadas pelo DEM.

Quintella está no quarto mandato de deputado federal. Líder do PR na Câmara, partido da base do governo petista antes do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, pediu licença da liderança para votar pelo afastamento de Dilma. Ele foi nomeado ministro dos Transportes no primeiro dia do governo interino de Michel Temer, em 12 de maio do ano passado. Em 2018, a representação na Câmara chega ao fim e ele deve se candidatar mais uma vez, especialmente após ter visibilidade chefiando um ministério ligado à infraestrutura, com condições de apresentar obras e investimentos.

fonte: O Globo