quinta-feira, 21 de setembro de 2017

STF PROVA QUE LAVA JATO ESTÁ VIVA

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de enviar à Câmara a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer é menos importante pelo fato em si – e mais pelo que representa para o futuro da Operação Lava Jato.

A denúncia é falha ao tentar demonstrar que Temer liderava uma organização criminosa, embora traga inúmeras provas de que ele tomou parte em crimes. De todo modo, é ínfima a chance de que haja 342 deputados dispostos a autorizar o prosseguimento dela – lembre que 263 votaram contra a primeira denúncia.

A surpresa está não na peça concebida nos estertores da gestão de Rodrigo Janot na Procuradoria-Geral da República (PGR), nem no corporativismo dos deputados que, temendo a Lava Jato, querem manter os privilégios de seus cargos (ontem votaram pelo fim das coligações nas eleições proporcionais, mas só depois de 2020, já que esperam ainda usá-las para ser reeleitos em 2018).

A surpresa está no STF, onde a Lava Jato ganha fôlego depois de um ano de derrotas sucessivas. Na semana passada, a Corte manteve, por 9 votos a 0, o direito de Janot apresentar sua denúncia. Ontem, por 7 a 1 (faltando ainda o voto de três ministros), autorizou o envio da segunda denúncia à Câmara. Apenas o ministro Gilmar Mendes votou contra por enquanto.

As duas votações demonstram que a percepção no tribunal ainda é majoritariamente favorável à Lava Jato. Apesar das divergências pontuais com o ministro-relator Edson Fachin, parece haver no plenário maioria sólida em favor da PGR. Num ano de refluxo da operação, não é pouco. 

É a posição oposta à consolidada na Segunda Turma onde, desde o início do ano, várias decisões favorecem os réus – na mais flagrante, o ex-ministro José Dirceu deixou a cadeia. No primeiro semestre, a absolvição da chapa Dilma/Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a recusa de prender o senador Aécio Neves e a manutenção do deputado Rodrigo Loures e de Dirceu em prisão domiciliar deixaram no ar um inconfundível cheiro de pizza.

A crise deflagrada pela delação da JBS pôs em cheque a credibilidade de Janot e da própria PGR.  Espalhou-se por Brasília o sentimento de que a nova procuradora-geral, Raquel Dodge, seria mais flexível, mais sensível às demandas dos advogados dos réus. Esperava-se, também, a troca de comando na Polícia Federal (PF), cujos recursos para a Lava Jato foram esvaziados no governo Temer.

A decisão do STF sugere que a vida dos corruptos não será tão fácil quanto parecia. Dodge pode ter um estilo mais sereno e menos espalhafatoso que Janot, porém isso não implica que necessariamente será mais leniente. Ao contrário, as acusações que fizer terão o benefício de ser produzidas por alguém que os próprios adversários da Lava Jato julgam insuspeita. Finalmente, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, decidiu manter no cargo o diretor da PF.

Não há muita dúvida de que Temer se safará de mais esta denúncia na Câmara. No entanto os políticos de Brasília não têm motivo algum para soltar fogos. Os debates no plenário do STF prometem ser robustos, com o ministro Gilmar Mendes liderando o grupo dos favoráveis a impor freios à Lava Jato.

É exatamente o esperado de uma Justiça independente, que funciona. O STF está diante de acusações contra PT, PMDB da Câmara e do Senado – além de dezenas de inquéritos e denúncias contra políticos individualmente. As delações prováveis de Antonio Palocci ou Geddel Vieira Lima ainda prometem incrementá-las. Em breve, virão as primeiras condenações de réus com prerrogativa de ser julgados no STF. As últimas votações na Corte só demonstram que a Lava Jato está vivíssima.

por Helio Gurovitz / G1