quinta-feira, 26 de outubro de 2017

FORO PRIVILEGIADO DESVIRTUA FUNÇÕES DO STF, DIZ MORO

O juiz Sérgio Moro, responsável pelas ações da Lava Jato em primeira instância, afirmou na manhã da última terça-feira (24), em São Paulo, que o foro privilegiado dado a políticos tem que ser mudado e é um desvirtuamento da função dos ministros do Supremo Tribiunal Federal (STF).

"Acho que existe perspectiva mais ampla sobre o foro privilegiado, tem que se pensar sobre isso. É importante ter a ideia de que nenhuma instituição é perene, não estamos presos", disse o magistrado.

"Há desvirtuamento do STF, já que os ministros têm que se preocupar cotidianamente com casos concretos e não ficar com temas constitucionais que impactam toda a sociedade", disse o juiz durante debate no Fórum Estadão que comparou a operação Lava Jato, que investiga esquema de corrupção na Petrobras, com a Operação Mãos Limpas, que investigou durante 13 anos corrupção sistêmica no governo italiano. 

A realização do evento foi uma parceria entre o jornal "O Estado de S.Paulo" e o Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP). Participaram do evento dois ex-magistrados italianos e que eram promotores na época da operação - Piercamillo Davigo e Gherardo Colombo.

"Eu até imagino a frustração de um ministro que quer discutir temas constitucionais relevantes como ensino religioso, cotas e questões da execução, até a prisão em segunda instância, e fica preso para decidir busca, apreensão e quebra de sigilos. É um desvirtuamento [da função do STF]. Isso tem que ser mudado", completou.

Moro também afirmou que, se tivéssemos “eliminado” políticos com práticas criminosas desde a década de 1990, não teríamos encontrado um apartamento com R$ 51 milhões em espécie. A Polícia Federal (PF) encontrou as impressões digitais do ex-ministro Geddel Vieira Lima no apartamento onde foi encontrado o montante. A quantia representa a maior apreensão em dinheiro vivo já feita pela PF.

“Eu posso falar com mais conforto de um agente político com o qual foram encontradas dezenas de milhões de reais. Se formos estudar a vida desse indivíduo, vamos perceber que ele tem histórico de práticas criminosas desde a década de 90. Se nós tivéssemos eliminado isso [naquela época], não teríamos encontrado o apartamento com R$ 51 milhões”, disse.

Moro também disse que “não se resolve problemas de corrupção somente com processos judiciais”. Para o magistrado, são necessárias “reformas mais abrangentes”.

“Se esses crimes não têm resposta institucional, a tendência é crescerem”, afirmou. “Mas a redução da impunidade pelos processos judiciais não é condição suficiente. É necessária uma reforma para diminuir incentivos e oportunidades de corrupção.”

O magistrado comparou os corruptos a "serial killers": "A corrupção seria serial, [os crimes] foram cometidos de uma maneira serial".

No mesmo evento, o procurador federal e coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, afirmou que a desesperança em relação à operação existe por ainda verem "dinheiro em malas" e, também, porque o STF solta políticos.

"Muitas pessoas disseram que não acreditavam que pessoas seriam presas. Tenho visto muitas pessoas que perderam a esperança com a desconstrução das dez medidas. Dinheiros continuam andando em malas anos após a Lava Jato. Ministros do Supremo soltam corruptos", disse.

"A corrupção acaba alavancando a permanência de corruptos no poder, tornando círculo vicioso e a sociedade presa", completou.

Dallagnol negou que a Lava Jato use prisões em excesso. "As prisões foram em casos excepcionais, em que crimes foram praticados de forma serial, como já foi dito aqui [por Moro], e havia contratos de propina pendentes. Era para proteger a sociedade dos riscos e danos que essas pessoas representam", afirmou.