sexta-feira, 27 de julho de 2018

Banco em que Toffoli recebe 'mesada' da mulher foi citado nos pedidos de impeachment do ministro

A relação do ministro Dias Toffoli foi a base de alguns dos pedidos de impeachment que aguardam providências no Senado. Em pedido de 2015, o então procurador da Fazenda Nacional Matheus Faria Carneiro citava o fato de Toffoli ter julgado processos envolvendo o banco que tinha lhe concedido um generoso empréstimo. Na época, Carneiro declarou: "Ele foi relator e julgou ações em que era parte o Banco Mercantil, onde fez empréstimo milionário. Ao fazê-lo, julgou em estado de suspeição. Não interessa se julgou a favor ou contra o banco, mas o fato é que não poderia julgar. Ao julgar, incorreu em crime de responsabilidade. São fatos objetivos e notórios, não há discricionariedade [na denúncia]". O pedido do procurador foi arquivado pela Presidência do Senado, publica o site Folha Política. 

Segundo a publicação, em pedido de impeachment de 2016, o advogado Marco Vinicius Pereira de Carvalho apontou que as condições de pagamento do empréstimo contraído junto ao Banco Mercantil – no valor de R$ 931.196,51 – foram renegociadas “com sensível diminuição da taxa de juros anteriormente pactuada, situação que não é comum à maioria dos mutuários brasileiros, surgindo, ante o exposto, uma enorme nuvem negra de desconfiança sobre a lisura e verdade dessa operação de crédito”.


Um novo pedido de impeachment, apresentado neste mês, também menciona o banco, além das ligações do ministro com o Partido dos Trabalhadores e, especificamente, com o ex-ministro José Dirceu, a quem Toffoli concedeu um habeas corpus de ofício (sem que a defesa tenha precisado pedir). 

Em reportagem dos jornalistas Eduardo Barretto e Filipe Coutinho, a revista Crusoé expôs que Toffoli recebe, nesse banco, uma "mesada" de sua mulher. A reportagem mostra detalhes da relação do banco com o ministro. 

Leia trecho: 

Crusoé descobriu que, ao menos em 2015, a área técnica do Banco Mercantil do Brasil viu indícios de lavagem de dinheiro nas transações envolvendo a conta do ministro. A conclusão dos técnicos do banco, por si só, não é um atestado de ilegalidade. A regra manda que, nessas situações, as transações tidas como suspeitas sejam reportadas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o Coaf, o órgão de inteligência do Ministério da Fazenda que registra as operações num banco de dados e, a depender do caso, encaminha os indícios para as autoridades competentes, como a polícia ou o Ministério Público. Todos os dias, os bancos em geral reportam milhares de transações ao Coaf, desde grandes transferências a saques vultosos em dinheiro vivo. Em casos como o de Toffoli, as normas do Banco Central mandam que sejam consideradas atípicas movimentações habituais de valores sem justificativa clara e, ao mesmo tempo, incompatíveis com a renda do cliente. Para não falar, obviamente, do fato de o ministro se enquadrar no perfil de “pessoa exposta politicamente”, o que ao menos no papel obriga os bancos a acenderem o sinal amarelo sempre que houver qualquer indicação de movimentação fora dos padrões. Acontece que, apesar da sugestão da área técnica de encaminhar os dados ao Coaf em 2015, houve uma ordem explícita da diretoria do Mercantil para que a comunicação não seguisse adiante. O caso, que deveria ser despachado para a sede do Coaf, em Brasília, foi simplesmente engavetado. Os diretores do banco disseram que a renda do casal estava desatualizada e que, por isso, o alerta não deveria ser disparado. Tudo ficou como estava. E as transações seguiram ocorrendo.


No pente-fino que fizeram sobre as operações financeiras de Toffoli, os técnicos do Banco Mercantil levantaram todos os sinais atípicos em torno da conta do ministro. Inclusive o fato de ela ser movimentada por um procurador, o tal funcionário do gabinete. Ricardo Newman de Oliveira, servidor de carreira do Banco do Brasil, trabalha com Toffoli há pelo menos dez anos. Antes, ele era gerente de agências em Brasília. Quando Toffoli foi nomeado advogado-geral da União, Newman recebeu o convite para ser seu “assessor externo”. Deu liga. Já no Supremo, primeiro o ministro o nomeou como assistente de gabinete. Depois, o promoveu para assessor direto, um dos cargos mais cobiçados na burocracia da corte. Newman aparece nos registros da área técnica do Banco Mercantil justamente por acumular o papel de assessor no STF com o de administrador da conta de Toffoli. Na prática, é ele quem cuida pessoalmente das despesas custeadas com a mesada repassada por Roberta Rangel. O bancário que Toffoli mantém no gabinete aparece ainda nos registros por outra razão: ele próprio figurou, por vezes, como destinatário de parte do dinheiro que entra na conta do ministro. Ao todo, Newman recebeu mais de 150 mil reais em transferências feitas com autorização de Toffoli.

O Banco Mercantil foi criado em Curvelo, cidade do interior mineiro, a 160 km de Belo Horizonte. Desde a década de 1950, é controlado pela família Araújo, tradicional no estado. O foco principal de suas operações está em Minas e no interior de São Paulo. Atualmente, o Mercantil diz ter cerca de um milhão de correntistas. A relação do ministro Toffoli com o banco é um capítulo à parte. Além de figurar como relator de processos de interesse do Mercantil no Supremo, o ministro aparece como beneficiário de generosas operações autorizadas pela cúpula do banco. Desde 2009, quando Toffoli passou a integrar a corte, chegaram por lá cerca de 270 processos que tinham o Mercantil como uma das partes – seja no polo passivo ou ativo. Toffoli foi relator de 13 dessas ações e não se declarou impedido. Em outra frente, na relação banco-cliente, os caminhos de Toffoli e do Mercantil também se cruzaram. Documentos internos do banco obtidos por Crusoé mostram que, em 2011, Toffoli pediu um empréstimo de 900 mil reais ao Mercantil. As parcelas ficaram em 13.806 reais, a serem pagas ao longo de 15 anos. A prestação representava quase 75% dos 18 mil reais líquidos que Toffoli recebia oficialmente àquela altura. Mesmo assim, o banco considerou que a prestação era compatível com os seus rendimentos e liberou o financiamento. E a taxa de juros foi generosa: 1,35% ao mês. Naquela época, o setor de financiamentos do Mercantil operava com uma média de 2,6% de juros ao mês para o crédito pessoal. Ou seja, Toffoli teve uma taxa de praticamente a metade da que era oferecida aos demais clientes.

Graças ao Mercantil, o ministro também apareceu em uma investigação do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. Os procuradores descobriram que o banco foi usado para repassar 350 mil reais para Toffoli dar aulas na Universidade Gama Filho. Em uma decisão temerária e repleta de suspeitas, o enrolado Postalis, o fundo de pensão dos funcionários dos Correios, havia escolhido a instituição para investir parte de seu dinheiro. Enquanto não recebia os aportes, era com dinheiro do Banco Mercantil que a Gama Filho pagava alguns de seus prestadores de serviço. Um deles era Toffoli, que dava aulas na universidade. O dinheiro era repassado pelo Mercantil e, em seguida, transferido para o ministro. Quando a Gama Filho recebia os recursos do Postalis, ressarcia o banco. Ocorria uma espécie de triangulação. Um dos citados na investigação do Ministério Público é Ronald Guimarães. Empresário, ele tinha um processo que chegou ao Superior Tribunal de Justiça, em Brasília, em 2014, envolvendo uma imobiliária registrada em seu nome. Era uma causa de incríveis 250 milhões de reais e o empresário já tinha uma estrela em sua defesa. Era Cezar Peluso, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal. Mesmo assim, Ronaldo Guimarães não titubeou e contratou uma advogada de Brasília: Roberta Maria Rangel. O caso segue em aberto, agora no Supremo e com outros advogados, no gabinete da ministra Cármen Lúcia.
Além dos pedidos de impeachment que se acumulam na mesa do presidente do Senado, Toffoli é alvo de uma campanha para que não se torne presidente do Supremo Tribunal Federal. Um abaixo-assinado para que ele não seja presidente do Supremo já tem quase 300 mil assinaturas. A petição pode ser acessada neste link.