sábado, 21 de julho de 2018

Crise prisional brasileira poderia ser resolvida com menos de 1% da arrecadação anual

Você não leu errado, o número é esse mesmo. E é ainda pior do que você imagina: o cálculo considera “apenas” os tributos federais e o ICMS dos estados. Não fazem parte desse número os impostos municipais, as receitas previdenciárias ou o IPVA, por exemplo.

Falta de vontade dos governantes ou domínio do narcotráfico na nossa política?

O descaso dos governantes com o sistema prisional é algo muito nebuloso. O relatório de auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) elaborado para avaliar a execução dos gastos do sistema penitenciário, após a onda de rebeliões nos presídios em 2017, é um show de horrores: repasses de recursos federais aos governos estaduais sem qualquer planejamento, a não utilização dos recursos disponibilizados pelo FUNPEN (Fundo Penitenciário Nacional) no valor de R$3 bilhões, números de eficiência e de gestão penitenciária não auditáveis e não disponíveis.

O Pnasp (Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional) foi lançado em 2011. É um programa que visava, em resumo, criar 42 mil vagas prisionais. Seu resultado final foram obras inacabadas e o abandono da gestão do programa pelo próprio gestor.  Nem metade das vagas foram criadas. As obras desse programa foram marcadas por falhas no processo de licitação, local de construção inadequado e outras diversas falhas apontadas no relatório do TCU. O TCU ainda detectou que os estados foram responsáveis por 56% dos entraves para o sucesso do projeto e a Caixa Econômica Federal por 22%. Que entraves seriam esses?

O que transparece é que não há vontade política nenhuma de resolver o problema. Seria falta de vontade por motivo ideológico, falta de competência ou por coerção do narcotráfico?

A audiência de custódia e as vagas prisionais

Alguns estados utilizam o déficit de vagas prisionais para justificar a implementação da audiência de custódia, algo que não é bem visto pela Polícia Militar e pela sociedade em geral. Diversos vídeos no YouTube mostram depoimentos de policiais reclamando da maneira enganosa que a audiência de custódia é utilizada, sendo utilizada apenas pra fomentar a impunidade dos criminosos, e libertá-los do encarceramento. Acabar com a audiência de custódia parece ser algo benéfico para a luta contra o crime. Havendo mais presídios e mais vagas prisionais, haveria menos razões para a prática da audiência de custódia.

Como menos de 1% da arrecadação pode resolver esse problema?

O déficit de vagas prisionais no Brasil gira em torno de 250 mil e o custo médio de construção por cada vaga é de R$59 mil reais, de acordo com o relatório de auditoria do TCU n°. TC 003.673/2017-0.

Convertendo esses números, resolver o problema do déficit de vagas prisionais no Brasil custa aproximadamente R$15 bilhões no total (250 mil vagas vezes R$59 mil). O fato de esse problema existir é tão absurdo, em termos financeiros, que a tese de que o problema é político fica em evidência e difícil de ser refutada.

O próprio FUNPEN disponibilizou para os estados R$ 3,6 bilhões em verbas para construção e ampliação de presídios.

Portanto, para prover as 250 mil vagas necessárias para solucionar o problema do déficit de vagas prisionais seria preciso mais R$12 bilhões (R$15 bilhões necessários menos R$3 bilhões já disponibilizados). Em apenas 2 anos, se o governo federal aplicar 0,5% de suas arrecadações federais e os governos estaduais aplicarem 0,5% de sua arrecadação com ICMS, o problema estaria resolvido. A conta é simples. As arrecadações federais (R$900 bilhões) e as arrecadações de ICMS (R$400 bilhões), por ano, somadas totalizam R$1,3 trilhões. 0,5% de R$1,3 trilhões totaliza R$6,5 bilhões. Em dois anos poderiam ser direcionados R$13 bilhões de reais para a construção e manutenção de presídios, mais que suficientes para a construção de mais de 250 mil vagas prisionais.

O problema da manutenção dos presídios, após a criação das vagas

O custo médio mensal de um presidiário é de R$2.400,00 (por ano R$28.800,00). Portanto, a criação de 250 mil vagas criaria um custo adicional de manutenção de presídios de R$7,2 bilhões por ano (R$28.800,00 vezes 250 mil vagas).

Se cada estado direcionar 1,77% de sua arrecadação anual APENAS com o ICMS para cobrir esse custo seria suficiente. Alguns estados gastam mais do que esse percentual com comunicação e propaganda. Numa escala de prioridade, o problema da segurança pública parece ser mais importante do que a propaganda.

Resultado nítido

Existem recursos abundantes para resolver o problema do déficit de vagas na prisão. É financeiramente nítido que os governantes não desejam resolver o problema prisional no Brasil. Resta entender qual a verdadeira motivação pra isso.

Eduardo da Costa, para o site Conexão Política.